Monday

LÍNGUA DE GATO

(Ísis Zisels)

Gosto de gatos. Felinos são animais estéticos: possuem deslumbrante capacidade de embelezar qualquer ambiente. Desfilam feito obras de arte ambulantes entre obstáculos, adaptando-se aos mesmos. Sinuosos, precisos, compõe com elegância genuína o cenário onde habitam.

Conquistam determinado lugar não porque almejam submetê-lo, mas porque sabem aproveitar o espaço de modo que as coisas, ali dispostas, naturalmente, vinculem-se a eles. Assim, são, simultaneamente, cativados pelo território ocupado durante o jogo de interação.

Olhos atentos, misteriosos, desafiadores. Não temem o confronto com o outro. Ao contrário, deliciam-se a partir da intrigante experiência... Há um prazer malicioso na possibilidade de redirecionar, inadvertidamente, o espectador ao próprio abismo, atuando, ao mesmo tempo, como quem o espreita.

Vaidosos... Quiçá?  O que soa orgulho é a manifestação da dignidade perante o reconhecimento  da própria solidão. Característica também peculiar dos bípedes implumes, simbolicamente estruturados, dotados de desejo e fantasia...

A propósito, que patético: eu, aqui, humanizando os gatos! Logo eles que utilizam a língua áspera para a limpeza pessoal, enquanto procuro surpreender-me com representações de mim mesma. Mas a linguagem não me serve para lamber pelos e inventar sabores? Afinal, a curiosidade matou o gato?